Um olhar mais apurado sobre Altamira, cidade do sudeste paraense com população estimada em 100 mil habitantes, é capaz de revelar detalhes importantes sobre o município que mais será afetado, econômica e socialmente, pela construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte. Um deles em especial, no entanto, direciona para o caminho da preocupação. O município, definitivamente, não está preparado para receber o exército de 100 mil novos moradores que devem se instalar na região, nos próximos dez anos.
A estimativa do excedente populacional em Altamira a partir de Belo Monte está prevista nos estudos de impactos ambientais realizados sobre o projeto. Mesmo para quem já mora na cidade, o acesso a serviços básicos como água potável, saneamento e pavimentação ainda são escassos. Em tempos de chuva, como atualmente, o município padece com ruas alagadas e sujas pela piçarra que beira o asfalto das principais vias. "Lavo o carro todo dia, depois do expediente. Se não for assim, fica difícil arrumar passageiro. Ninguém gosta de andar em carro sujo, não é?", diz o taxista Marcelo Trumier, no caminho entre o aeroporto de Altamira e o hotel.
A rede hoteleira da cidade também precisa ser melhorada. Os poucos leitos disponibilizados pelo setor no município precisam ser triplicados nos próximos cinco anos. Os que já existem também precisam ser melhorados. "A impressão é de que a cidade ainda não tem noção do que realmente está por vir. Muita gente ainda não entendeu o que vai significar a construção da usina (de Belo Monte) em Altamira", comenta Ana Paula Souza, coordenadora-geral da Fundação Viver, Produzir e Preservar.
Altamira não tem um único edifício residencial. O maior prédio da cidade tem apenas três andares. O crescimento vertical do município, apontado por alguns como a saída para acomodar parte do excedente populacional que será trazido pela futura usina, também se tornará inviável caso a infraestrutura necessária para acomodar e transportar essas pessoas não seja montada com antecedência.
Transporte também é algo que será difícil de melhorar na cidade. Somente as três principais ruas do município têm capacidade para suportar o tráfego de coletivos. As demais vias, além de estreitas, têm suas margens constantemente ocupadas por pedestres, já que, a exemplo de muitos bairros da capital, o direito de andar pelas calçadas foi suprimido por conta de construções irregulares feitas pelos moradores.
Investimentos
Uma das saídas para que Belo Monte leve desenvolvimento a Altamira e região é apontada pelo presidente do Consórcio Belo Monte e prefeito do município de Anapu, Francisco de Assis Souza. É dele a articulação para que todo o investimento destinado à acomodação daqueles que chegarão ao sul e sudeste paraense seja feito nas cidades, e não na construção de vilas permanentes, como as construídas em Tucuruí e Barcarena, por exemplo, na ocasião em que grandes projetos foram instalados naquelas cidades.
"Todos irão ganhar caso a infraestrutura de transporte, urbanismo e saneamento seja construída na própria cidade. Ganham os que irão se instalar aqui. Ganham, principalmente, as pessoas que já estão aqui há dezenas de anos. Será muito injusto que Belo Monte chegue e todos esses antigos moradores continuem vivendo as mesmas mazelas de antes", diz Chiquinho do PT, como também é conhecido o prefeito de Anapu.
O Consórcio Belo Monte foi criado para mediar o diálogo entre o governo federal e os onze municípios que serão afetados pela construção da usina. O órgão é formado pelos municípios de Altamira, Anapu, Medicilândia, Brasil Novo, Vitória do Xingu, Pacajá, Senador José Porfírio, Placas, Uruará, Porto de Moz e Gurupá. Durante 20 anos, essas prefeituras receberão investimentos em saúde, infraestrutura urbana, capacitação profissional, educação, transporte e saneamento como compensações aos efeitos negativos gerados pela obra